sábado, 10 de abril de 2010

A Importância da Literatura Cinzenta num Mundo a Cores

O último número da Nature inclui um artigo interessante sobre a denominada grey literature. No Reino Unido, desde há 20 anos que a legislação obriga os projectos de construção à avaliação do seu impacto no património arqueológico e a eventuais intervenções de salvaguarda. Isso conduziu a um incremento da investigação neste campo e calcula-se que mais de 90% desta seja resultante de projectos da arqueologia empresarial. Infelizmente, a sua divulgação está na maioria das vezes limitada aos relatórios que as empresas entregam aos seus clientes e aos organismos que tutelam a arqueologia britânica. Estes relatórios não-publicados constituem a literatura cinzenta e os académicos têm apontado algumas dificuldades em aceder a eles dado que não integram bibliotecas e não estão por isso disponibilizados para empréstimo inter-bibliotecário. Além disso, os relatórios entregues aos clientes são tratados como mercadorias e aqueles apresentam por vezes relutância em facultar a sua leitura.

Um exemplo da importância da literatura cinzenta é apresentado no artigo em questão. Durante os anos 80, os académicos concluíram que a população diminuíra drasticamente durante a Idade do Bronze nas Ilhas Britânicas. Esta teoria deveu-se ao reduzido número de povoados até então encontrados e atribuíveis a esta cronologia específica. Porém, os dados da arqueologia empresarial vieram invalidar esta conjectura dado que inúmeros povoados foram entretanto descobertos. Assim sendo, os investigadores não se podem dar ao luxo de omitir a literatura cinzenta nos seus projectos, pois é fundamental para a compreensão do Passado. Felizmente, já estão em curso alguns projectos de divulgação online, como são os casos da Oxford Archaeology e da Wessex Archaeology.

De certa forma, esta situação encontra paralelo na realidade portuguesa. Apesar das intervenções arqueológicas estarem obrigadas à entrega de relatório, a sua consulta está muito limitada geograficamente ao Arquivo do IGESPAR e a sua divulgação online poderia ser uma solução viável. Numa época de encurtamento das distâncias a nível global, pouco sentido faz que, a título de exemplo, um investigador residente no Porto tenha de se deslocar 300km para aceder a um processo em Lisboa. Esperemos que um recurso desta natureza esteja num horizonte próximo. Partilhem connosco as vossas opiniões!

3 comentários:

  1. A ERA-Arqueologia disponibiliza os seus relatórios on-line. É um processo que se vai realizando; para além disso, e desde a sua fundação, a empresa cede cópias pdf a quem as solicita. Não esqucer que ainda disponibilizamos a consulta na nossa biblioteca de elementos que não constem dos relatórios. Para nós não existe bibliografia cinzenta...basta publicar (e publicamos)e disponibilizar o que está por publicar; mas tembé é necessário saber pedir.
    Para além disso, por razões de transparência e de livre acesso a informação que assumo como pública, desde sempre defendo que todos os relatórios deveriam ser disponibilzados, on-line, pela tutela. Talvez um dia lá cheguemos.

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  2. Conheço o (bom) exemplo da ERA - Arqueologia e tenho pena que (1) outras empresas não o façam também e que (2) seja necessário que a própria empresa o faça pois creio que tal devia ser incumbência da tutela.

    Sempre achei que a disponibilização de todos os relatórios na internet, em livre acesso, seria um bom meio de elevar a qualidade dos mesmos. Já que não basta apelar à ética do arqueólogo e empresa de arqueologia para que estes façam um bom relatório, talvez resulte apelar à vergonha!

    Sugiro que haja um período de tolerância (6 meses?) entre a aprovação do relatório por parte da tutela e a sua disponibilização on-line para assegurar que os arqueólogos exerçam a sua função de divulgação dos dados inéditos. Até esses 6 meses terminarem, o relatório estaria disponível em todas as extensões do IGESPAR (em formato PDF), de modo a que pudesse ser consultado, por solicitação, por quem necessitasse de o fazer no âmbito de trabalhos de arqueologia preventiva ou de de emergência.

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  3. De facto, o acesso à informação tem, com a criação do IGESPAR, sido praticamente impossível.
    Já não bastava as pessoas terem de se deslocar a Lisboa, como agora só o podem fazer um dia por semana, o que é incompatível para todos os que se encontram a trabalhar...
    Os relatórios deveriam estar todos acessiveis na página do IGESPAR e, tendo em conta as Normas Portuguesas de Referências Bibliográficas, estes documentos são considerados publicações, logo podem ser disponibilizados de imediato.

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