Este artigo do Publico relata um interessante (e infelizmente raro) episódio dum empresário Português que soube apostar na investigacao científica. E resultou num metodo inovador para datar oliveiras antigas.
A oliveira (Olea europaea L.) fazia parte do pacote original de especies incluído na horticultura inicial praticada pela humanidade no Próximo Oriente. As outras especies incluidas neste primeiro ímpeto de domesticação de árvores ou plantas de jardim foram a figueira, tamareira e a vinha (Zohary and Hopf, 2000). O fruto (azeitona) conserva-se bem e pode ser consumido o ano todo, tradicionalmente com pão. O azeite servia como alimento, como unguento e base para perfumes e como fonte de iluminação em candeias. A sua fácil conservação por períodos longos de tempo permitia um comércio de longa distância.
A oliveira é uma árvore de fruto extremamente resistente e bem adaptada ao clima Mediterrânico. De tal forma que
a sua presença é considerada como um indicador dos limites do bioma Mediterrânico. A frutificação inicia-se cerca de 5 anos após a plantação e se for bem tratada uma oliveira pode produzir frutos durante séculos e atingir idades superiores a 1500 anos. Essa antiguidade fonte de admiracao e veneracao populares em muitas localidades.
Várias evidências sugerem que a oliveira (O. europea var. europaea) foi domesticada a partir da oliveira-brava (O. europea var. sylvestris ou O. europaea subsp. oleaster), por vezes designada genericamente de ‘zambujeiro’. Estas duas sub-espécies são as únicas nativas do Mediterrâneo. Existem outras sub-espécies no complexo Olea que apesar de terem uma distribuição geográfica afastada do Mediterrâneo são inter-fertéis com a oliveira e poderão ter contribuído para a diversidade genética da árvore cultivada: 1) O. europaea subsp. maroccana (no sul de Marrocos), 2) O. europaea subsp. laperrinei (nas montanhas do Sahara); 3) O. europaea subsp. cerasiformis (presente apenas no arquipélago da Madeira); 4) O. europaea subsp. guanchica (nas ilhas Canárias) e 5) O. europaea subsp. cuspidata (com uma dsitribuição mais alargada da África até à China passando pelo Médio Oriente) (Besnard e tal. 2002).
O. europaea var. cerasiformis
A oliveira-brava reproduz-se por polinização cruzada (auto-incompatibilidade) e por semente sendo os seus frutos são geralmente mais pequenos do que as da oliveira. Já a oliveira domesticada reproduz-se apenas por propagação vegetativa podendo reverter ao estado selvagem se for propagada por semente (Zohary and Hopf, 2000). Tal facto não impediu o aparecimento de diversidade genética observável nas centenas de variedades de oliveira existentes e que mostram variação na forma, tamanho e conteúdo oleaginoso da azeitona. Estas terão aparecido através de cruzamentos espontâneos com oliveiras-bravas ou induzidos em “campos experimentais” seguido da propagação vegetativa de variedades com características desejadas (Bertin et al. 2001).
Os primeiros vestígios arqueobotânicos de oliveira remontam a sítios Calcolíticos em Israel e no Jordão (curiosamente fora do limite actual de presença de oliveira-brava), mas só na Idade do Bronze esta especie aparece em Creta e na Grécia (Zohary and Hopf, 2000). O cultivo de oliveira e a produção de azeite terão sido introduzidos na Península Ibérica apenas no 1º milénio BCE, provavelmente pelos Fenícios (Sallares, 2007). Os primeiros vestígios de azeitona e produção de azeite na Península Ibérica surgem em níveis Fenícios de Cerro de Villar, Málaga, e Castillo de Doña Blanca, perto de Cadiz (Buxó, 2008).
Caroços de azeitona do sitio Calcolítico de Tuleilat Ghassul, Jordão (Zohary & Hopf, 2000).
Estudos de biodiversidade utilizando DNA antigo (Elbaum et al 2006), aspectos morfológicos (Terral et al. 2004), variação em marcadores genéticos no genoma nuclear (Belaj et al. 2002) e no do cloroplasto (Besnard et al. 2002) parecem apontar diferenças entre as oliveiras no Mediterrâneo Ocidental e as do Mediterrâneo Central e Oriental. É incerto se isto se deve a uma introdução diferencial da espécie ou ao facto de a Península Ibérica e os Balcãs terem servido como refúgios a oliveiras-bravas durante a última glaciação. As oliveiras-bravas destas duas regiões serão portanto geneticamente distintas devido ao isolamento geográfico e ao cruzarem-se com as oliveiras cultivadas podem ter dado origem a oliveiras geneticamente diferentes.
A oliveira esteve presente desde cedo na cultura popular de toda a bacia Mediterrânea como é evidente em histórias bíblicas (a pomba da paz trazia no bico um ramo de oliveira, o jardim das oliveiras onde Jesus passa a última noite, etc) e em lendas greco-romanas (normalmente associada a Atena/Minerva e ao conhecimento da agricultura). Dos árabes herdamos o termo “azeite” (al-zait) e a oliveira e o seu produto é presença frequente em músicas populares (“Ó Oliveira da Serra”), na toponímia (freguesia dos Olivais, Lisboa), na antroponímia (família “Oliveira”) e em ditados populares ("Azeite, vinho e amigo, melhor o antigo"). São estes provérbios que por vezes oferecem pistas quanto ao seu cultivo (“Oliveira do meu avô, figueira de meu pai e vinha a quem eu puser”; “Quem azeite colhe antes do Natal, azeite deixa no olival”; “Encosta soalheira, planta-lhe oliveira”; “Olival que bem parece, devagar cresce”).
E recomendo a toda a gente uma visita a Trás-os-Montes pouco antes do Natal para participar na apanha da azeitona, vergastando a árvore com uma vara até os frutos caírem todos numa rede (bolhas nas mãos e bom azeite garantidos).